Desenvolvido por Andressa Pasqualini em 2022 do livro Visão Sofisticada dos Direitos Humanos e da Justiça Transitória: análise do livro Primo Levi – trilogia de Auschwitz, publicado em 2021 pela Editora Edições Nosso Conhecimento.
Genealogia e fontes do Direito Internacional
O Direito Internacional é o responsável por respaldar e limitar relações entre diferentes povos, podendo existir entre particulares, chamado de Direito Internacional Privado, ou entre Estados Soberanos e organizações internacionais, na sua vertente do Direito Internacional Público e à qual será dada ênfase nesse momento.
Assim, o Direito Internacional Público acaba por regular questões comerciais, de segurança, meio ambiente, assuntos climáticos, proteção aos seres humanos, direitos de refugiados dentre outros assuntos de interesse internacional, transpondo fronteiras e influenciado em questões internas, porém sem relação de subordinação ou hierarquia doméstica.
Importante saber que, nas palavras do Dr. Francisco Rezek:
Não há hierarquia entre as normas de direito internacional público, de sorte que só a análise política – de tudo independente da lógica jurídica – faz ver um princípio geral, qual o da não intervenção nos assuntos domésticos de certo Estado [...] Esse quadro [de subordinação] não encontra paralelo na ordem internacional, onde a coordenação é o princípio que preside a convivência organizada de tantas soberanias.”
Nesse sentido, pode-se conceituar Direito Internacional Público como sendo um sistema autônomo baseado no consentimento de Estados Soberanos, no princípio do pacta sunt servanda e que leva em consideração o “direito das gentes”, das nações e dos povos.
Assim, se o Direito Internacional permeia as relações internacionais, então não se pode dizer ser um instituto originado no século XX, nem mesmo no século XIX ou XVIII, tendo em vista que desde a antiguidade há registros de permutas entre grupos humanos autônomos, que evoluiu para o escambo e o comércio entre diferentes povos e chegando à troca (e por quê não, imposição) de ideias e interesses de diversas searas, desde ideologias políticas e religiosas até questões territoriais.
Todavia, o recorte histórico que orientará o presente estudo será feito a partir da Idade Contemporânea, com a Revolução Francesa, no século XVIII, e a Convenção de Viena, no século XIX.
Acesso o link abaixo e assista ao vídeo do Professor Dr. Ronaldo Bastos sobre as teorias Dualista e Monista do Direito Internacional Público e a relação entre normas internacionais e normas domésticas.
Direito Internacional | Teorias - Dualismo e Monismo | Ep. 259
Link: <https://youtu.be/Net74Q5mmBc>. Acesso em 01 de setembro de 2022.
A Revolução Francesa trouxe consigo muitas mudanças, a começar pela derrubada do Antigo Regime (1789), a eliminação dos últimos resquícios feudais e por ter espalhado seus ideais de igualdade, fraternidade e liberdade, que resultou na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Com o fim da Revolução Francesa e a ascensão política de Napoleão o mapa da Europa é alterado significativamente em razão dos conflitos e conquistas territoriais napoleônicas o que, após sua derrocada, deu origem à Convenção de Viena (1815), que objetivava a reestruturação das fronteiras europeias, devolvendo territórios e a supremacia política e, consequentemente, provocando alterações políticas e econômicas no continente.
Assim, tem-se início um importante marco no Direito Internacional Público Contemporâneo, tendo em vista que é a partir da Convenção de Viena que são acordadas regras, como a proibição do tráfico de escravos, a liberdade de navegação em rios internacionais e a neutralidade perpétua da Suíça, que guiariam a comunidade internacional para se evitar a repetição de momentos de instabilidade, recém acontecidos, e uma nova revolução.
Inclusive, como resultado, foi criada a Santa Aliança entre Rússia, Prússia, França e Áustria, um acordo de cooperação bélica e militar caso fosse necessário intervir diante a ameaça à hegemonia política de alguma das nações integrantes.
Diante o surgimento da Santa Aliança e a sua ameaça de uma nova colonização nos Estados Unidos, tem início a Doutrina Monroe (1823) que defendia a ideia de que a América é para os Americanos, e que os Estados Unidos não interfeririam na hegemonia política europeia da mesma forma que a Europa não deveria interferir na América.
Em 1871 tem palco os processos de unificação da Itália e da Alemanha que reforçavam o conceito de nacionalização. Anos depois, em 1899 e 1907, acontecem, respectivamente, a Primeira e a Segunda Conferências de Haia que deram origem à Convenção sobre a Resolução Pacífica de Controvérsias Internacionais, estando, portanto, ao lado da Convenção de Genebra (1864) como um dos primeiros tratados internacionais sobre guerra e paz.
Perceba, portanto, que este período foi de grande robustez e positivação para o cenário do Direito Internacional Público.
Após o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), com a assinatura de um tratado de paz, chamado de Tratado de Versalhes, e a criação da Liga das Nações, os Estados envolvidos tentavam responsabilizar os perdedores e evitar uma possível segunda guerra. Diante o fracasso desse segundo objetivo a Liga das Nações é extinta em 1942.
A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) acabou por mudar radicalmente os destinos da humanidade, não apenas colaborando para a instauração da Guerra Fria, como também deu causa para a elevação do movimento de libertação nacional dos países explorados pelo colonialismo europeu e à fundação da ONU em 1945.
A ONU, criada a partir da Carta de São Francisco (ou Carta das Nações Unidas), por sua vez, tem como princípio a manutenção da paz e da segurança internacionais, cooperando com a amistosidade das relações internacionais e da harmonia entre os povos.
Como consequência, foi concebida a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), importante documento no âmbito do Direito Internacional para a promoção e a proteção da dignidade humana.
O artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (CIJ) traz um rol não exaustivo nem ordenado hierarquicamente das fontes formais do Direito Internacional, veja-se:
Artigo 38. 1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito internacional as controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará:
Do cotejado, extrai-se que são fontes formais do Direito Internacional o costume internacional, a doutrina e a jurisprudência internacionais, os tratados e os princípios gerais de Direito, estes classificados como a proibição do uso ou ameaça da força, a solução pacífica de controvérsias, a não intervenção nos assuntos internos dos Estados, o dever de cooperação internacional, a igualdade de direitos e autodeterminação dos povos, a igualdade soberana dos Estados e a boa-fé no cumprimento das obrigações.
Com relação à hierarquia, não há consenso na doutrina, vez que, uma corrente minoritária entende pela primazia dos tratados, por se tratar de uma norma escrita e, portanto, com maior clareza e precisão, enquanto a majoritária defende a simples inexistência de hierarquia, de modo que um tratado mais recente pode modificar um costume e vice-versa.
Sobre a não exaustividade do rol, há que falar das fontes extra estatutárias, que podem ser tanto comuns ao direito doméstico quanto exclusivamente peculiares ao âmbito internacional. São elas: os princípios gerais do Direito Internacional, os atos unilaterais dos Estados, as decisões das organizações internacionais, o soft law, a analogia, a equidade e o jus cogens.
Por fim, há que se falar na divisão doutrinária das fontes entre principais ou auxiliares e convencionais e não convencionais.
O texto do artigo 38 traz expressamente que a jurisprudência e a doutrina são auxiliares, de modo que as demais são principais.
Já as convencionais são aquelas resultantes de acordos de vontade entre os sujeitos, abrangendo em especial a figura dos tratados. Por outro lado, as não convencionais são aquelas originadas a partir da evolução e atualização da realidade das relações internacionais, como é o caso do jus cogens.
A estrutura dedicada à regular relações entre Estados Soberanos, disciplinando questões de interesse geral, como Direitos Humanos, Direito Ambiental, questões políticas, ideológicas e territorialistas, que é autônomo, não hierarquizado junto à norma doméstica e que observa o princípio do pacta sunt servanda é denominado Direito Internacional Público, sendo o responsável pela busca da paz e equilíbrio mundial e sendo positivado ao longo da história do próprio mundo.
Referências
Bibliográficas
Ribero, Katherine. (2021). Visão Sofisticada dos Direitos Humanos e da Justiça Transitória: análise do livro Primo Levi – trologia de Auschwitz. Mauritius: OmniScriptum Publishing Group.
Canezin, Eduardo Salles. (2013). A Evolução do Direito Internacional Público. [Online]. Acesso em 01 de setembro de 2022. Disponível em: https://bit.ly/3eQUzUi
Pinto, Gilian de Moraes. (2019). Evolução do Direito Internacional Público e as Relações Internacionais Entre a Pluralidade de Estados Soberanos.
Rezek, Francisco. (2022). Direito Internacional Público: Curso Elementar. 18 ed. SaraivaJur: São Paulo. [Online]. Acesso em 01 de setembro de 2022. Disponível em: https://bit.ly/3Ds1eyq
Bittar Filho, Carlos Alberto. (1992). Evolução Histórica do Direito Internacional. [Online]. Acesso em 01 de setembro de 2022. Disponível em: https://bit.ly/3BeTm0p
Trindade, Antônio Augusto Cançado. (2017). Princípios do Direito Internacional Contemporâneo. [Online]. Acesso em 01 de setembro de 2022. Disponível em: https://bit.ly/3djljw3
Livro de Referência:
Visão Sofisticada dos Direitos Humanos e da Justiça Transitória: análise do livro Primo Levi – trilogia de Auschwitz
Katherine Ribeiro
Editora Edições Nosso Conhecimento, 2021.